O controle de constitucionalidade é
um sistema resultante de uma conjuntura positivista, respaldada pelas ideias do
austríaco Hans Kelsen, no século XX, e é ligado principalmente à ideia da
supremacia da Constituição sobre as demais normas. Argumenta o jurista que o
direito regula sua própria criação, de forma que “uma norma jurídica regula o
procedimento pelo qual outra norma jurídica é produzida” [1].
Neste sentido, afirma que:[2]
Devido ao caráter dinâmico do direito,
uma norma vale porque e até ser produzida através de outra norma, isto é,
através de outra determinada norma, representando esta o fundamento da validade
para aquela. A relação entre a norma determinante da produção de outra norma
produzida de maneira determinada pode ser representada com a imagem espacial do
ordenamento superior e inferior.
Desta forma, atribui Kelsen à norma
o valor que a norma determinante o dá, partindo do pressuposto de que uma norma
jurídica regula a criação de outra norma jurídica, criando assim o que num
prisma espacial corresponderia a um escalonamento, ou, do alemão, Stufenbau.
Assim sendo, podemos concluir que o
ordenamento jurídico se trata de uma escala com diversas camadas normativas, e
não um sistema de normas postas isonomicamente.
Aduz ainda o jusfilósofo que no topo
destas camadas estará a Constituição, concluindo que:[3]
[...]A Constituição, para ser modificada ou
derrogada, deverá prescrever um procedimento diferente, mais complexo do que o
procedimento legislativo comum; deve haver, ao lado da forma legal, uma forma
constitucional específica.
Neste sentido, vemos que deverá a
Constituição ter uma especial proteção, pelo fato de ser a norma fundamental,
ou a pedra angular sobre a qual é construindo todo o ordenamento jurídico. Por
conseguinte, todas as demais normas têm sua validade justificada por esta carta
maior, visto que aquela norma que a ela fugir será ilegítima, devendo ser
afastada do ordenamento.
Surge, portanto, o controle de
constitucionalidade, podendo ser prévio ou preventivo, enquanto não tenha ainda
a norma sido promulgada - ou repressivo, na intenção de afastar a eficácia e
aplicação de determinada norma ilegítima.
Tal controle repressivo será ser
exercido, no Brasil, quando pelo Poder Judiciário, de forma difusa ou
concentrada.
Inicialmente surgiu o controle difuso
de constitucionalidade nos Estados Unidos da América, quando, após ter perdido
a eleição à Presidência do país em 1800 para o seu ex-Vice Presidente Thomas
Jefferson, o então Presidente John Adams deixou nomeadas como juízes federais
pessoas ligadas ao seu governo.
Ao
assumir, porém, em 1801, Thomas Jefferson orientou ao seu recém-nomeado
Secretário de Estado, e grande federalista, James Madison que não mais efetivasse
a nomeação de uma das pessoas que haviam sido indicadas por Adams, chamada
William Marbury.
Demandou,
portanto, judicialmente Marbury em face de Madison, até que, dois anos após, no
ano de 1803, manifestou-se o então Chief
Justice John Marshal, da Suprema Corte americana, passando a tratar também
do dever de “os tribunais, bem como os demais departamentos” [4]
estarem vinculados à Constituição. [5]
Seria, portanto, uma atividade usual
e intrínseca à atividade jurisdicional a interpretação da Constituição, de
forma que todo magistrados deveria exercer o controle de constitucionalidade no
caso concreto.
O controle concentrado de
constitucionalidade teve seu surgimento da Áustria, quando sua Constituição de
1920 criou o Tribunal Constitucional, órgão exclusivo de controle de
constitucionalidade.
Hans
Kelsen, idealizador, afirmava que a Constituição, por sua supremacia, não
poderia ser interpretada por qualquer pessoa ao ponto de permitir que normas
fossem anuladas, sendo estas passíveis de anulação unicamente após o Tribunal
Constitucional determinar desta forma [6],
indo na direção oposta à opinião anteriormente proferida pela Suprema Corte
americana.
Neste
sentido, existiam ambas as vertentes, tendo o Brasil adotado um sistema de
controle misto.
No
Brasil, portanto, o controle constitucional concentrado é exercido por uma
única corte, o Supremo Tribunal Federal, através de ações abstratas e diretas,
ou seja, ações cujo objeto não passa da constitucionalidade ou não de
determinado ato normativo, com efeitos erga
omnes.
Para
tal, os únicos legitimados ativos estão previstos no art. 103 da Constituição
Federal de 1988, quais sejam:
I – o Presidente da República;
II – a Mesa do Senado Federal;
III – a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV – a Mesa de Assembleia Legislativa ou
da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
V – o Governador de Estado ou do Distrito
Federal;
VI – o Procurador-Geral da República;
VII – o Conselho Federal da Ordem dos
Advogados do Brasil;
VIII – partido político com
representação no Congresso Nacional;
IX – confederação
sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.
Já o controle difuso é aquele
exercido por via incidental, no caso concreto, em processos que não têm a
declaração de constitucionalidade ou não como objeto principal, mas dela
necessitam para a tutela do direito. Neste sentido, terá efeitos apenas inter partes.
Ainda, poderá o Supremo Tribunal
Federal atuar no controle difuso, por via recursal.
[1] KELSEN, Hans. Teoria pura do
direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução: J.Cretella
Jr. e Agnes Cretella. 2. ed. rev. da tradução. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2002. p. 103.
[2] KELSEN, Hans. op. cit.
[3] KELSEN, Hans. op. cit. p.
104.
[4] MARSHALL, John. Decisões
constituintes de Marshall. Reimpressão fac-similar. Brasília: Ministério da
Justiça, 1997. 432 p. (Arquivos do Ministério da Justiça). Tradução de Américo
Lobo; Apresentação de Nelson A. Jobim; Introdução de Josaphat Marinho.
[5] LENZA, Pedro. Direito
constitucional esquematizado. 16. ed. ver., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 268.
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