INTRODUÇÃO: ENTRE PRINCÍPIOS E REGRAS
O constitucionalismo contemporâneo
ou neoconstitucionalismo
trouxe consigo diversas
mudanças essenciais para a teoria geral do direito, sobretudo no âmbito metodológico.
É cediço que as discussões acerca da ontologia normativa e hermenêutica
encontraram local minimamente unânime, em meio aos aclamados embates de positivitas
contra não-positivistas
.
No neoconstitucionalismo, a
leitura clássica do princípio da separação de poderes, que impunha limites
rígidos à atuação do Poder Judiciário, cede espaço a outras visões mais
favoráveis ao ativismo judicial em defesa dos valores constitucionais. No lugar
de concepções estritamente majoritárias do princípio democrático, são
endossadas teorias de democracia mais substantivas, que legitimam amplas
restrições aos poderes do legislador em nome dos direitos fundamentais e da
proteção das minorias, e possibilitem a sua fiscalização por juízes não
eleitos. E ao invés de uma teoria das fontes do Direito focada no código e na
lei formal, enfatiza-se a centralidade da Constituição no ordenamento, a
ubiqüidade da sua influência na ordem jurídica, e o papel criativo da
jurisprudência.
Ao reconhecer a força
normativa de princípios revestidos de elevada carga axiológica, como dignidade
da pessoa humana, igualdade, Estado Democrático de Direito e solidariedade
social, o neoconstitucionalismo abre as portas do Direito para o debate moral.
Restou, por fim, reconhecida a normatividade dos
princípios, colocados em mesmo patamar que as regras, variando destas
qualitativamente: enquanto as normas são aplicadas segundo o critério do
all or nothing (
Alles-oder-Nichts), de forma que uma válida necessariamente
excluirá a outra do ordenamento, os princípios são normas aplicadas com o
critério do sopesamento
, constituindo uma “espécie
de normas jurídicas por meio das quais são estabelecidos deveres de otimização
aplicáveis em vários graus, segundo as possibilidades normativas e fáticas”
.
O Direito Ambiental, como área autônoma, é guiado por
princípios específicos, além daqueles gerais da metodologia jurídica e do
Direito Constitucional, Econômico etc.
1. PRINCÍPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
O princípio do desenvolvimento sustentável é norma prevista
nas Leis nº 12.187/09 e 12.305/10, e decorre diretamente dos princípios
constitucionais informadores da ordem econômica da “defesa do meio ambiente” e
da “redução das desigualdades regionais e sociais” (art. 170 da Constituição da
República Federativa do Brasil).
Preconiza que o desenvolvimento econômico não pode em
hipótese alguma passar por cima de valores essenciais à dignidade humana, como
o meio ambiente sadio. Conforme oportunamente observa Jorge Munhós de Souza, ao
discorrer sobre a importância da corrente teórica liberalista:
John Rawls
afirmou que ‘cada pessoa possui uma inviolabilidade fundada na justiça que nem
mesmo o bem-estar da sociedade como um todo pode sobrepujá-la’. A idéia de
Rawls era afirmar o raciocínio deontológico do liberalismo kantiano em oposição
ao pensamento consequencialista do utilitarismo de Bentham, evitando conclusões
que, por exemplo, pudessem justificar a escravidão para fins de maximização da
utilidade geral da sociedade.
Neste sentido tem se manifestado o Superior Tribunal de
Justiça:
AGRAVO
REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME AMBIENTAL. PRINCÍPIOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E DA PREVENÇÃO. POLUIÇÃO
MEDIANTE LANÇAMENTO DE DEJETOS PROVENIENTES DE SUINOCULTURA DIRETAMENTE NO SOLO
EM DESCONFORMIDADE COM LEIS AMBIENTAIS. ART. 54, § 2º, V, DA LEI N. 9.605/1998.
CRIME FORMAL. POTENCIALIDADE LESIVA DE CAUSAR DANOS À SAÚDE HUMANA EVIDENCIADA.
CRIME CONFIGURADO. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
I. Os princípios
do desenvolvimento sustentável e da prevenção, previstos no art. 225, da
Constituição da República, devem orientar a interpretação das leis, tanto no
direito ambiental, no que tange à matéria administrativa, quanto no direito
penal, porquanto o meio ambiente é um patrimônio para essa geração e para as
futuras, bem como direito fundamental, ensejando a adoção de condutas
cautelosas, que evitem ao máximo possível o risco de dano, ainda que potencial,
ao meio ambiente.
II. A Lei n.
9.605/1998, ao dispor sobre as sanções penais e administrativas derivadas de
condutas e atividades lesivas ao meio ambiente e dar outras providências,
constitui um divisor de águas em matéria de repressão a ilícitos ambientais.
Isto porque ela trouxe um outro viés, um outro padrão de punibilidade em
matéria de crimes ambientais, trazendo a figura do crime de perigo.
III. O delito
previsto na primeira parte do art. 54, da Lei n. 9.605/1998, possui natureza
formal, porquanto o risco, a potencialidade de dano à saúde humana, é
suficiente para configurar a conduta delitiva, não se exigindo, portanto,
resultado naturalístico. Precedente.
IV. A Lei de
Crimes Ambientais deve ser interpretada à luz dos princípios do desenvolvimento
sustentável e da prevenção, indicando o acerto da análise que a doutrina e a jurisprudência
tem conferido à parte inicial do artigo 54, da Lei n. 9.605/1998, de que a mera
possibilidade de causar dano à saúde humana é idônea a configurar o crime de
poluição, evidenciada sua natureza formal ou, ainda, de perigo abstrato.
V. Configurado o
crime de poluição, consistente no lançamento de dejetos provenientes da criação
de cerca de dois mil suínos em sistema de confinamento em 3 (três) pocilgas
verticais, despejados a céu aberto, correndo por uma vala que os levava até às
margens do Rio do Peixe, situado em área de preservação permanente, sendo a
atividade notoriamente de alto potencial poluidor, desenvolvida sem o devido
licenciamento ambiental, evidenciando a potencialidade do risco à saúde humana.
VI. Agravo
regimental provido e recurso especial improvido, restabelecendo-se o acórdão
recorrido. (AgRg no REsp 1418795/SC, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Rel.
p/ Acórdão Ministra REGINA HELENA COSTA, QUINTA TURMA, julgado em 18/06/2014,
DJe 07/08/2014).
2. PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA
PROPRIEDADE
Quando a questão vem a ser de direito privado, temos como
um dos princípios máximos o princípio da autonomia da vontade ou da autonomia
privada. Todavia, mesmo tal princípio se rende à função social. Conforme
Francisco Amaral:
A autonomia
privada é o poder que os particulares têm de regular, pelo exercício de sua
própria vontade, as relações que participam, estabelecendo-lhe o conteúdo e a
respectiva disciplina jurídica. Sinônimo de autonomia da vontade para grande
parte da doutrina contemporânea, com ela porém não se confunde, existindo entre
ambas sensível diferença. A expressão 'autonomia da vontade' tem uma conotação
subjetiva, psicológica, enquanto a autonomia privada marca o poder da vontade
no direito de um modo objetivo, concreto e real.
Neste sentido, segundo os ensinamentos do civilista Flávio
Tartuce
, o novel termo 'princípio
da autonomia privada' leva o direito privado, irretratavelmente, a um estado de
observância da função social da vontade privada.
Nossa Constituição de 1988, fortemente influenciada pelos
ideais neoconstitucionalistas de Ronald Dworkin, Robert Alexy e Gustav
Zagrebelsky, trouxe em seu art. 5.º, XXII, o direito de propriedade, trazendo
já no próximo inciso sua limitação: “a propriedade atenderá a sua função
social”.
Em matéria ambiental, a Lei nº 11.428/06, ao regular o
Bioma Mata Atlântica, foi a responsável por positivar tal princípio. Sua
interpretação se dá no sentido de que a propriedade não poderá oferecer perigo
ou causar danos ao meio ambiente, de forma que sua função social deverá ser
observada também na perspectiva ambiental.
Assim entende o Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO E
PROCESSUAL CIVIL. ART. 535 DO CPC. OMISSÕES. AUSÊNCIA. MEIO AMBIENTE. ÁREA DE
PRESERVAÇÃO PERMANENTE. PRESCRIÇÃO. ARESTO RECORRIDO. FUNDAMENTOS
CONSTITUCIONAIS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INEXISTÊNCIA. SÚMULA 126/STJ.
1. Todas as
questões suscitadas pela parte foram apreciadas pelo acórdão recorrido que
concluiu pela inexistência de autorização ambiental para a construção do
restaurante em área de preservação permanente, bem como que seriam inócuas as
alegações de que à época da construção do restaurante, há mais de 25 anos, já
inexistia vegetação natural, o que não caracteriza a suposta contrariedade ao
artigo 535 do CPC.
2. O aresto
impugnado perfilha o mesmo entendimento desta Corte, o qual considera que as
infrações ao meio ambiente são de caráter continuado e que as ações de
pretensão de cessação de danos ambientais é imprescritível. Precedentes.
3. O Tribunal a quo entendeu razoável a
demolição do imóvel situado na Praia de Taquaras com base em dispositivos da
Constituição da República - arts. 216, 225 e 170, incisos III e VI, bem assim
após minuciosa ponderação dos princípios e postulados constitucionais
abrangidos na lide - direito à moradia e ao meio ambiente, função social da
propriedade e precaução. No entanto, não se constata a interposição do
competente recurso extraordinário, impondo a incidência da Súmula 126/STJ.
4. Recurso
especial conhecido em parte e não provido. (REsp 1223092/SC, Rel. Ministro
CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2012, DJe 04/02/2013).
3. PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO
O princípio da prevenção, em matéria ambiental, está
expressamente previsto nas Lei nº 11.428/06 e 12.187/09.
É aplicada tomando-se por base determinado risco
cientificamente certo, e vincula, sobretudo, a Administração Pública, enquanto
gestora socioambiental. Neste sentido, no exercício de seu poder de polícia,
deve a Administração impor restrições e condições para a exploração sadia do
meio ambiente, com o fito de evitar riscos conhecidos.
Assim entendeu o Superior Tribunal de Justiça, ao deliberar
sobre suspensão de liminar interposta por Município acerca de empreendimentos
condominiais que surtiriam efeitos potencialmente danosos à saúde pública em
razão de provável avanço imobiliário desordenado:
AGRAVO
REGIMENTAL NO PEDIDO DE SUSPENSÃO. GRAVE LESÃO À ORDEM E ECONOMIA PÚBLICAS.
INEXISTÊNCIA. PEDIDO DE SUSPENSÃO INDEFERIDO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
I - Consoante a
legislação de regência (v.g. Lei n. 8.437/1992 e n. 12.016/2009) e a
jurisprudência deste Superior Tribunal e do c. Pretório Excelso, somente será
cabível o pedido de suspensão quando a decisão proferida contra o Poder Público
puder provocar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.
II - Não se
mostra viável na presente senda o exame do acerto ou desacerto de decisum, não
podendo o incidente ser utilizado com o objetivo de discutir o próprio mérito
da ação principal, in casu, a necessidade, ou não, de se observar a Lei de
Parcelamento de Solo Urbano nos licenciamentos e aprovações dos condomínios que
estão sendo implementados no Município de Concórdia.
III - Em relação
à alegação de grave lesão à ordem econômica, depreende-se dos autos especial
preocupação de que da forma como os empreendimentos condominiais estão sendo
tratados pelas autoridades locais surjam efeitos potencialmente danosos à saúde
pública em razão de provável avanço imobiliário desordenado.
IV - Entendo que
os provimentos judiciais os quais se pretende a suspensão não tem o condão de
gerar lesão à ordem pública do Município do Concórdia, já que ao Poder
Judiciário incumbe fazer cessar qualquer ilegalidade que seja levada a seu
conhecimento, ainda que tal medida possa frustrar, em algumas situações, o
implemento de políticas públicas urbanas, no presente caso, a expansão
imobiliária no município de Concórdia, considerada, pelas decisões ora ainda
impugnadas, maléfica ao meio ambiente.
V - Assim,
entendo prestigiado o interesse público da municipalidade já que as rr.
decisões impugnadas apenas conferiram eficácia ao princípio ambiental da
prevenção, haja vista o conhecimento notório de que o crescimento urbano
desordenado pode comprometer os serviços essenciais tais como, água, esgoto e
segurança. Agravo regimental desprovido. (AgRg na SLS 1.744/SC, Rel. Ministro
FELIX FISCHER, CORTE ESPECIAL, julgado em 07/08/2013, DJe 26/08/2013).
4. PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO
O princípio da precaução, por outra via, tem vez quando há
não certeza, mas dúvida científica. Por não possuir plena certeza dos efeitos
que se originarão de determinada conduta, deve a Administração, por meio de seu
poder de polícia, proceder de forma cautelosa, evitando ações arriscadas
.
Desta preocupação exsurge, na jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça, ainda outro princípio, o do in dubio pro natura:
ADMINISTRATIVO.
AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESMATAMENTO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE
(MATA CILIAR). DANOS CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE. BIOMA DO CERRADO. ARTS. 4º,
VII, E 14, § 1º, DA LEI 6.938/1981, E ART. 3º DA LEI 7.347/1985. PRINCÍPIOS DO
POLUIDOR-PAGADOR E DA REPARAÇÃO INTEGRAL. REDUCTIO AD PRISTINUM STATUM. FUNÇÃO
DE PREVENÇÃO ESPECIAL E GERAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO
DE FAZER (RESTAURAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA) E DE PAGAR QUANTIA CERTA
(INDENIZAÇÃO). POSSIBILIDADE. DANO AMBIENTAL REMANESCENTE OU REFLEXO. ART. 5º
DA LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO. INTERPRETAÇÃO IN DUBIO
PRO NATURA.
1. Cuidam os
autos de Ação Civil Pública proposta com o fito de obter responsabilização por
danos ambientais causados por desmatamento de vegetação nativa (Bioma do
Cerrado) em Área de Preservação Permanente. O Tribunal de Justiça do Estado de
Minas Gerais considerou provado o dano ambiental e condenou o réu a repará-lo,
porém julgou improcedente o pedido indenizatório cumulativo.
2. A legislação
de amparo dos sujeitos vulneráveis e dos interesses difusos e coletivos deve
ser interpretada da maneira que lhes seja mais favorável e melhor possa
viabilizar, no plano da eficácia, a prestação jurisdicional e a ratio essendi
da norma de fundo e processual. A
hermenêutica jurídico-ambiental rege-se pelo princípio in dubio pro natura.
3. A
jurisprudência do STJ está firmada no sentido de que, nas demandas ambientais,
por força dos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum,
admite-se a condenação, simultânea e cumulativa, em obrigação de fazer, não
fazer e indenizar. Assim, na interpretação do art. 3º da Lei 7.347/1985, a
conjunção "ou" opera com valor aditivo, não introduz alternativa
excludente. Precedentes da Primeira e Segunda Turmas do STJ.
4. A recusa de
aplicação, ou aplicação truncada, pelo juiz, dos princípios do poluidor-pagador
e da reparação in integrum arrisca projetar, moral e socialmente, a nociva
impressão de que o ilícito ambiental compensa, daí a resposta administrativa e
judicial não passar de aceitável e gerenciável "risco ou custo normal do
negócio". Saem debilitados, assim, o caráter dissuasório, a força pedagógica
e o objetivo profilático da responsabilidade civil ambiental (= prevenção geral
e especial), verdadeiro estímulo para que outros, inspirados no exemplo de
impunidade de fato, mesmo que não de direito, do degradador premiado, imitem ou
repitam seu comportamento deletério.
5. Se o meio
ambiente lesado for imediata e completamente restaurado ao seu estado original
(reductio ad pristinum statum), não há falar, como regra, em indenização.
Contudo, a possibilidade técnica e futura de restabelecimento in natura (= juízo
prospectivo) nem sempre se mostra suficiente para, no terreno da
responsabilidade civil, reverter ou recompor por inteiro as várias dimensões da
degradação ambiental causada, mormente quanto ao chamado dano ecológico puro,
caracterizado por afligir a Natureza em si mesma, como bem inapropriado ou
inapropriável. Por isso, a simples restauração futura - mais ainda se a perder
de vista - do recurso ou elemento natural prejudicado não exaure os deveres
associados aos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum.
6. A
responsabilidade civil, se realmente aspira a adequadamente confrontar o
caráter expansivo e difuso do dano ambiental, deve ser compreendida o mais
amplamente possível, de modo que a condenação a recuperar a área prejudicada
não exclua o dever de indenizar - juízos retrospectivo e prospectivo. A
cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não configura bis in idem,
tanto por serem distintos os fundamentos das prestações, como pelo fato de que
eventual indenização não advém de lesão em si já restaurada, mas relaciona-se à
degradação remanescente ou reflexa.
7. Na vasta e
complexa categoria da degradação remanescente ou reflexa, incluem-se tanto a
que temporalmente medeia a conduta infesta e o pleno restabelecimento ou
recomposição da biota, vale dizer, a privação temporária da fruição do bem de
uso comum do povo (= dano interino, intermediário, momentâneo, transitório ou
de interregno), quanto o dano residual (= deterioração ambiental irreversível,
que subsiste ou perdura, não obstante todos os esforços de restauração) e o
dano moral coletivo. Também deve ser restituído ao patrimônio público o
proveito econômico do agente com a atividade ou empreendimento degradador, a
mais-valia ecológica que indevidamente auferiu (p. ex., madeira ou minério
retirados ao arrepio da lei do imóvel degradado ou, ainda, o benefício com o
uso ilícito da área para fim agrossilvopastoril, turístico, comercial).
8. Recurso
Especial parcialmente provido para reconhecer a possibilidade, em tese, de
cumulação da indenização pecuniária com as obrigações de fazer voltadas à
recomposição in natura do bem lesado, devolvendo-se os autos ao Tribunal de
origem para que verifique se, na hipótese, há dano indenizável e fixe eventual
quantum debeatur. (REsp 1145083/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA
TURMA, julgado em 27/09/2011, DJe 04/09/2012).
5. PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL DO DANO
AMBIENTAL
O princípio da reparação integral do dano ambiental ordena
que aquele que causou danos ambientais deva reparar integralmente o que for
reparável, além de sofrer repreensão pecuniária coletiva a título de
fluid recovery, de forma que se mostram
plenamente cumuláveis diversas condenações simultâneas em um mesmo julgado,
e. g., bem como obrigações de indenizar,
de fazer e de não fazer.
O Superior Tribunal de Justiça aplica tal princípio
pacificamente, entendendo que o art. 3º da Lei n.° 7.347/85, que afirma que a
ACP “poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de
obrigação de fazer ou não fazer”, deve ser lido cumulativamente, e não
alternativamente, de maneira que as conjunções alternativas devem ser
interpretadas como aditivas.
Neste sentido:
AMBIENTAL,
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO E PRESERVAÇÃO
DO MEIO AMBIENTE. COMPLEXO PARQUE DO SABIÁ. OFENSA AO ART. 535, II, DO CPC NÃO
CONFIGURADA. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÕES DE
FAZER COM INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA. ART. 3º DA LEI 7.347/1985. POSSIBILIDADE.
DANOS MORAIS COLETIVOS. CABIMENTO.
1. Não ocorre
ofensa ao art. 535 do CPC, se o Tribunal de origem decide, fundamentadamente,
as questões essenciais ao julgamento da lide.
2. Segundo a
jurisprudência do STJ, a logicidade hermenêutica do art. 3º da Lei 7.347/1985
permite a cumulação das condenações em obrigações de fazer ou não fazer e
indenização pecuniária em sede de ação civil pública, a fim de possibilitar a
concreta e cabal reparação do dano ambiental pretérito, já consumado.
Microssistema de tutela coletiva.
3. O dano ao
meio ambiente, por ser bem público, gera repercussão geral, impondo
conscientização coletiva à sua reparação, a fim de resguardar o direito das
futuras gerações a um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
4. O dano moral
coletivo ambiental atinge direitos de personalidade do grupo massificado, sendo
desnecessária a demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a
indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado.
5. Recurso
especial provido, para reconhecer, em tese, a possibilidade de cumulação de
indenização pecuniária com as obrigações de fazer, bem como a condenação em
danos morais coletivos, com a devolução dos autos ao Tribunal de origem para
que verifique se, no caso, há dano indenizável e fixação do eventual quantum
debeatur. (REsp 1269494/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado
em 24/09/2013, DJe 01/10/2013)