"Duas coisas enchem o ânimo de admiração e veneração sempre novas e crescentes, quanto mais frequentemente e com maior assiduidade delas se ocupa a reflexão: o céu estrelado acima de mim e a lei moral dentro de mim".
Crítica da razão prática, Kant.

Wednesday 30 October 2013

PONTOS SOBRE O MANDADO DE INJUNÇÃO

1. SOBRE OS REQUISITOS CONSTITUCIONAIS PARA O MANDADO DE INJUNÇÃO

            Os doutrinadores Alexandre de Moraes[1] e Rodrigo Reis Mazzei[2] são concordes ao afirmar que são dois os requisitos: a) a omissão legislativa no que diga respeito à regulamentação do exercício de direitos constitucionalmente assegurados ou de direitos relativos à nacionalidade, cidadania e soberania, mesmo sendo estes oriundos de norma infraconstitucional; b) e então, é necessário que essa omissão ou falta de regulamentação impeça ou torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais ou das prerrogativas inerentes à nacionalidade, soberania e cidadania.
            Já Pedro Lenza[3] traz os requisitos da seguinte forma: a) norma constitucional de eficácia limitada que assegure direitos ou prerrogativas inerentes à nacionalidade, soberania e cidadania; b) falta de uma norma regulamentadora, que torne inviável o exercício de tais direitos e prerrogativas.
            Neste sentido, e após uma análise dos três autores, vemos três requisitos diversos, de forma que a impetração de mandado de injunção pressupõe: a) a existência de norma constitucional de eficácia limitada assegurando direitos ou norma infraconstitucional que assegure prerrogativas inerentes à nacionalidade, soberania e cidadania; b) o não cumprimento ou omissão, total ou parcial[4], por determinado ente estatal em regulamentar tal norma; c) a inviabilização do exercício de tais direitos por conta da omissão regulamentadora estatal.


2. SOBRE OS LEGITIMADOS CONSTITUCIONAIS PARA IMPETRAR O MANDADO DE INJUNÇÃO

            Destarte da ausência de indicação expressa pela Constituição Federal, entende-se que será legitimado todo aquele cuja omissão torne inviável o exercício de direitos constitucionalmente assegurados e prerrogativas inerentes à nacionalidade, soberania e cidadania, sendo cabível, inclusive, mandado de injunção coletivo ou mandado de injunção por pessoa jurídica de direito público.


3. SOBRE A POSSIBILIDADE DE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO IMPETRAR MANDADO DE INJUNÇÃO.

            Durante o trâmite do Mandado de Injunção nº 725, no ano de 2007, o Supremo Tribunal Federal entendeu, nos termos do voto do relator Min. Gilmar Mendes, que pessoas jurídicas de direito público podem também ser detentoras de direitos fundamentais, destarte do previamente alegado pela Procuradoria-Geral da República.
Inobstante, teve o voto, inclusive, respaldo também no art. 34, VII, alínea b da Constituição da República, quando esta assegura ao município sua autonomia, inclusive sob pena de intervenção federal por meio de ação direta de inconstitucionalidade interventiva pelo Procurador-Geral da República. Comentou ainda, o ministro, acerca de diversos casos nestes moldes ocorridos no direito ibero-americano, mencionando as intensas discussões a respeito dos limites dos direitos fundamentais.
            O MI 725, impetrado pelo município de Nova Brasilândia do Oeste, todavia, não foi conhecido, destacada a ilegitimidade ativa da parte. O argumento, porém, não foi a ilegitimidade dos municípios em geral, uma vez que ressaltou o ministro relator que “não se deve negar aos municípios, peremptoriamente, a titularidade de direitos fundamentais (...) e a eventual possibilidade de ações constitucionais cabíveis para sua proteção” (grifo nosso).
            Foi o argumento, todavia, a ilegitimidade, no caso concreto, do município pleitear aquele determinado direito. Segue, neste sentido, a ementa:

EMENTA: Mandado de injunção. 2. Alegada omissão legislativa quanto à elaboração de lei complementar a que se refere o §4º do art. 18 da Constituição federal, na redação dada pela emenda Constitucional nº 15/1996. 3. Ilegitimidade ativa do Município impetrante. Inexistência de direito ou prerrogativa constitucional do Município cujo exercício esteja sendo obstaculizado pela ausência da lei complementar federal exigida pelo art. 18, § 4º, da constituição. 4. Mandado de injunção não conhecido.

            Vê-se, portanto, que segundo o entendimento de nossa Suprema Corte, são as pessoas jurídicas de direito público também detentoras de direitos fundamentais, que deverão, portanto, ser amparados pelas respectivas garantias, bem como os writs cabíveis.



4. SOBRW OS LEGITIMADOS A FIGURAR NO PÓLO PASSIVO DA DEMANDA NO CASO DE MANDADO DE INJUNÇÃO

            Unicamente entes estatais, mais especificamente aqueles que hajam sido responsabilizados de regulamentar a norma constitucional assecuratória de direitos ou que traga prerrogativas inerentes à nacionalidade, soberania e cidadania.


5. SOBRE AS REGRAS DE COMPETÊNCIA FIXADAS PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL NO TOCANTE À APRECIAÇÃO DE MANDADO DE INJUNÇÃO

            Traz a Constituição da República, acerca da competência para apreciar mandado de injunção, as seguintes regras:

1)     Competência originária do Supremo Tribunal Federal:
Art. 102, I, q: Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe processar e julgar, originariamente, o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição do Presidente da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, da Mesa de uma dessas Casas Legislativas, do Tribunal de Contas da União, de um dos Tribunais Superiores, ou do próprio Supremo Tribunal Federal;

2)     Competência recursal do Supremo Tribunal Federal:
Art. 102, II, a: Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe julgar, em recurso ordinário, o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão;

3)     Competência originária do Superior Tribunal de Justiça:
Art. 105, I, h: Compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar, originariamente, o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição de órgão, entidade ou autoridade federal, da administração direta ou indireta, excetuados os casos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos órgãos da Justiça Militar, da Justiça Eleitoral, da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal;

4)     Competência recursal do Tribunal Superior Eleitoral:
Art. 121, §4º, V: Das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais caberá recurso ao TSE quando for denegado mandado de injunção.

5)     Competência estadual para apreciação do writ:
Art. 125, §1º: A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça.

Não obstante, Art. 104 da CE/PB: Compete ao Tribunal de Justiça processar e julgar o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição do Governador do Estado, da Mesa ou da própria Assembleia Legislativa, do Tribunal de Contas do Estado, do Tribunal de Contas dos Municípios, dos Prefeitos, da Mesa da Câmara de Vereadores, de órgãos, entidades ou autoridades das administrações direta ou indireta estaduais ou municipais ou do próprio Tribunal de Justiça do Estado;


6. SOBRE O RITO A SER OBSERVADO NO MANDADO DE INJUNÇÃO

            Traz o parágrafo único do art. 24 da Lei n. 8.038, de 28 de maio de 1990, atinente ao mandado de segurança, que: “No mandado de injunção e no habeas data, serão observadas, no que couber, as normas do mandado de segurança, enquanto não editada legislação específica”.
Neste sentido, o rito a ser observado será o previsto para o mandado de segurança, até que se tenha uma legislação específica para o writ em descortino. Entretanto, tem o Supremo Tribunal Federal entendido não caber determinados pontos procedimentais do mandado de segurança no mandado de injunção, como, por exemplo, a concessão de medida liminar, visto ser esta “imprópria ao instituto do mandado de injunção”.[5]


7. SOBRE OS EFEITOS NO MANDADO DE INJUNÇÃO.

            Partem-se em duas grandes correntes as teorias a respeito dos efeitos do mandado de injunção: a concretista e a não concretista.
            Orienta a teoria concretista que deverá o judiciário viabilizar o direito do impetrante no caso concreto, visto ser este fundamental, sem dependência do ente ou órgão que se omitiu. Por sua vez, a teoria não concretista defende que não pode o poder judiciário intervir na função legislativa, seja para obrigá-la ou para usurpá-la, legislando no caso concreto, devendo limitar-se a decretar a mora do poder omisso e reconhecê-la formalmente.
            A teoria concretista, separadamente, divide-se em duas correntes, a geral e a individual. Afirma a primeira que a decisão judicial no caso concreto terá efeito erga omnes, abrangido todos os indivíduos que se encontram incapacitados de exercitar seu direito. A segunda, adotada pelo Supremo Tribunal até o julgamento do Mandado de Injunção 708, relativo à greve no serviço público, defende que a decisão judicial para viabilização do exercício do direito no caso concreto terá efeito unicamente inter partes.
            Neste sentido, segue ainda a corrente concretista individual em duas vertentes: a direta e a intermediária.
Traz a corrente concretista individual direta que o judiciário, no intuito de fazer frente à inércia dos poderes e à inefetividade das normas constitucionais, implementará por si mesmo a eficácia da norma constitucional ao autor.
Já a corrente concretista individual intermediária, apresentada inicialmente através do posicionamento do Ministro Néri da Silveira durante sessão extraordinária do Supremo Tribunal Federal em 1995, dita que não se deve olvidar da tripartição e das respectivas funções de cada poder, de forma que seria ideal que o judiciário notificasse o poder omisso, dando a este um prazo para a confecção da regulamentação faltosa, sob pena de findo este efetivar-se a disposição do direito.[6]
Neste sentido, tem nossa Suprema Corte adotado a teoria concretista, com variações nos casos concretos entre geral e individual.




[1] MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 180.
[2] MAZZEI, Rodrigo Reis. Mandado de Injunção. In: DIDIER JR., Fredie. Ações Constitucionais. 2. ed. rev. e atual. Salvador: Jus Podium, 2007. p. 136-137.
[3] LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 16. ed. ver., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 1051.
[4] STF – Mandado de injunção nº 107-3 – Rel. Min. Moreira Alves, Diário da Justiça, Seção I, 21 set. 1990, p. 9.782.
[5] MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 183.
[6] Pronunciamento do Ministro Néri da Silveira. Ata da 7ª (sétima) sessão extraordinária do Supremo Tribunal Federal, realizada em 16 de março de 1995 e publicada no Diário da Justiça, 4 abr. 1995, Seção I, p. 8.265.


(por Jurandi Ferreira de Souza Neto)

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