"Duas coisas enchem o ânimo de admiração e veneração sempre novas e crescentes, quanto mais frequentemente e com maior assiduidade delas se ocupa a reflexão: o céu estrelado acima de mim e a lei moral dentro de mim".
Crítica da razão prática, Kant.

Wednesday 30 October 2013

SOBRE A GESTÃO COLETIVA DOS DIREITOS AUTORAIS

 Desde os primórdios da humanidade há aqueles indivíduos que dedicam a vida a expressar-se ou a registrar, por meio da arte, os acontecimentos.
Há, neste sentido, um problema a se resolver. Olvidando-se dos que produzem arte por mera distração, questiona-se acerca da situação daqueles que a produzem como meio de vida. Qual retorno terão e de que forma terão seu sustento? Ao se observar que o único produto advindo de seu trabalho é a arte, fez-se necessário encontrar alguma forma de fazer dela a fonte de rendimento de quem a produz.
Na área musical, com esta finalidade, foi criado em 1973, pela Lei 5.988, o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD), mantido posteriormente pela Lei 9.610 de 1988. Seu escopo é, primordialmente, fiscalizar a execução e utilização com fins lucrativos de obras musicais, fazendo incidir sobre tais execuções cobranças cujos pagamentos deveriam, em tese, ser repassados aos autores.
É o ECAD administrado por nove associações de gestão coletiva musical, constituindo, portanto, uma instituição privada.
É, portanto, questionável a sua legitimidade para atuar. Uma associação poderá representar e defender os direitos apenas e tão somente de seus associados. Faz, todavia, o ECAD, incidir cobrança sobre toda e qualquer execução musical com fins lucrativos, exigindo pagamento inclusive de execuções de composições das quais os autores não sejam sequer associados à instituição.
Vê-se que, neste sentido, o Escritório Central materialmente estaria exigindo pagamento pela execução de obras de terceiros e passando o valor para músicos associados. Ainda dentre os associados, devido à impossibilidade de controle das execuções por todo o Brasil, são privilegiados os mais divulgados pela mídia e mais executados.
Ademais, é a distribuição de valores feita através de uma porcentagem precariamente obtida com rádios e casas de show, de forma que aqueles que têm suas músicas pouco executadas nada recebem.
Vemos assim um tratamento ridiculamente desigual, a se priorizar não a arte em si nem a autoria, mas apenas criar uma enorme máquina de circulação de dinheiro, ao qual poucos e direcionados têm acesso.
Outrossim, mostra-se absurda a ausência de fiscalização estatal quanto à instituição, observada sua atuação fiscalizatória e arrecadatória, seu tamanho, e sua influência em uma área do porte da indústria musical. Portanto, uma organização deste tamanho deveria, não sendo estatal, intensamente fiscalizada por órgãos estatais, inclusive pelo Ministério Público, cuja função é também tutelar os direitos coletivos.
Nesta linha de pensamento, trouxe a Lei n.º 12.853 de 2013 inúmeras novidades quanto ao funcionamento do ECAD. Dentre outros pontos, calha mencionar como dois dos mais importantes a regulação do mandato dos dirigentes das associações de gestão coletiva de direitos autorais, bem como a regulação da cobrança feita pela instituição.
Tem-se, todavia, como mais importante, o fato de ter trazido a nova lei a obrigatoriedade de fiscalização do Escritório Central pela Administração Pública Federal, reconhecido, ainda, o interesse público da atividade e sua função social, e sendo apenas lícito efetuar a cobrança às associações que obtiverem habilitação pelo governo federal.

É seguro afirmar, portanto, que se faz imprescindível a aproximação do Estado da atividade do ECAD, seja por meio de agência reguladora a ser criada ou seja por meio do fiscal da lei constitucional, o próprio Ministério Público, na defesa do interesse público.

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